Compreender os textos Bíblicos não é tarefa fácil, e se torna praticamente impossível se não levarmos em conta os aspectos histórico-culturais e os costumes da época em que cada leitura se passa. Há muitas mensagens escritas que se apóiam nestes aspectos, além de leis específicas, metáforas temporais, problemas de tradução e até mesmo estilos usados pelos autores de cada livro, e quais elementos (ou mesmo objetivos) queriam enfatizar em seus textos.

CONDIÇÕES HISTÓRICO-CULTURAIS E COSTUMES DA ÉPOCA DAS PASSAGENS BÍBLICAS

LEITURAS DA SEMANA

"PRÓXIMA REUNIÃO: 12/Novembro 8:00pm"

Antes de cada reunião semanal, colocaremos nesta página informações úteis, sobre cada leitura, para nos ajudar nesta "viagem no tempo" e, assim, com o auxílio do Espírito Santo de Deus, entendermos as mensagens com este pano de fundo histórico e, finalmente, podermos transportá-las aos nossos dias e às nossas circunstâncias de hoje.

Ref. Domingo 16/Novembro/2025

33º Domingo do Tempo Comum - Ano C

1ª Leitura:  Profecia de Malaquias (Ml 3: 19-20a)

O nome “Malaquias” não é um nome próprio. A palavra significa “o meu enviado”. É o título tomado por um profeta anônimo, sobre o qual praticamente nada sabemos e que se apresenta como “enviado” de Javé.

Esse profeta exerceu a sua missão em Jerusalém, no período pós-exílico. O Templo já havia sido reconstruído e o culto já funcionava — ainda que mal. No entanto, o entusiasmo pela reconstrução estava apagado. Desanimado ao ver que as antigas promessas de Deus (veiculadas por Ezequiel e pelo Deutero-Isaías) não se tinham cumprido, o Povo tinha caído na apatia religiosa e na absoluta falta de confiança em Deus. Duvidava do amor de Deus, da sua justiça, do seu interesse por Judá. Todo este ceticismo tinha repercussões no culto (cada vez mais desleixado) e na ética (multiplicavam-se as falhas, as injustiças, as arbitrariedades). Este quadro nos situa na primeira metade do séc. V a.C. (entre 480 e 450 a.C.), muito próximo da época de Esdras e Neemias.

Malaquias, o “mensageiro de Javé” reage vigorosamente contra a situação em que o Povo de Judá está a cair. Defende intransigentemente os valores judaicos e a fé dos antepassados; aponta o dedo aos sacerdotes, aos levitas e a outros responsáveis pelo culto, denunciando o seu desleixo e venalidade; profetiza a chegada do tempo em que se oferecerá a Deus um culto puro e santo; coloca cada pessoa diante das suas responsabilidades para com Javé e para com o próximo; exige a conversão do Povo e o afastamento da idolatria; condena veementemente os casamentos mistos (entre judeus e não judeus), que fazem perigar a fidelidade a Javé. A sua lógica é a lógica deuteronomista: se o Povo se obstinar em percorrer caminhos de infidelidade à Aliança, voltará a conhecer a morte e a infelicidade, como aconteceu num passado recente; mas se o Povo se voltar para Javé e cumprir os mandamentos, voltará a gozar da vida e da felicidade que Deus oferece àqueles que seguem os seus caminhos.

Por detrás do texto que a liturgia deste domingo nos oferece como primeira leitura, está o ceticismo dos habitantes de Judá em relação à justiça de Deus, ao interesse de Deus em intervir na ordem do mundo. Eles se sentem desiludidos, pois lhes parece que Deus assume uma atitude de perfeita indiferença diante da sorte dos justos: “de que vale servir a Deus? Que lucramos em ter observado os seus preceitos e em ter andado de luto diante do Senhor do universo? E agora temos de chamar ditosos aos arrogantes, pois eles fazem o mal e prosperam; põem Deus à prova e ficam impunes”. É a eterna interrogação sobre o sentido do mal que cobre a terra, sobre a prosperidade dos pecadores em contraste com o sofrimento dos justos. Deus não quer saber? Deus não faz nada para restabelecer a justiça? Ele se afastou dos problemas dos homens e deixa que cada um faça o que quer?

Malaquias procura responder a estas questões. Garante que Deus não esquece os justos, os que constam do livro onde estão inscritos “os que temem o Senhor e prezam o seu nome”. Mais: Deus terá compaixão deles “como um pai que se compadece do filho que o serve”. Por isso, Deus vai atuar. Então, todos verão “de novo a diferença entre o justo e o ímpio, entre quem serve a Deus e quem não O serve”.

2ª Leitura:  Segunda Carta de São Paulo aos Tessalonicenses (2Ts 3: 7-12)

Tessalônica (a atual Salônica) era, em meados do séc. I, a cidade mais importante da Macedônia. . Tendo obtido do imperador Augusto o privilégio de “cidade livre”, era administrada por um conselho eleito pela assembleia do povo e presidida por magistrados denominados “politarcas”. Importante porto marítimo e cidade de intenso comércio, Tessalônica era uma encruzilhada religiosa, na qual os cultos locais e as religiões vindas do estrangeiro coexistiam lado a lado.

A cidade foi evangelizada por Paulo durante a sua segunda viagem missionária, muito provavelmente no Inverno do ano 49 ou 50. Paulo chegou a Tessalônica acompanhado por Silvano e Timóteo, depois de ter sido forçado a deixar a cidade de Filipos. Essa primeira estadia de Paulo em Tessalônica foi curta, talvez de cerca de três meses; no entanto, do labor apostólico de Paulo nasceu uma comunidade cristã numerosa e entusiasta, constituída maioritariamente por pagãos convertidos. De acordo com a informação dos Atos dos Apóstolos, a obra missionária de Paulo teve a oposição de alguns membros da comunidade judaica. Na sequência, alguns cristãos da cidade foram acusados de agir contra os decretos do imperador e levados diante das autoridades da cidade. Paulo foi obrigado a deixar a cidade às pressas, durante a noite. Dirigiu-se para a Bereia e, de seguida, para Atenas.

No entanto, o apóstolo estava preocupado com a situação da comunidade que tinha deixado em Tessalônica. Pressionados pelas autoridades da cidade, eles conseguiriam se manter fiéis ao Evangelho? Por isso, Paulo enviou Timóteo à Tessalônica para saber informações e para encorajar os tessalonicenses na fé. Timóteo, depois de cumprir a missão que lhe fora confiada, reencontrou Paulo em Corinto. As notícias trazidas por Timóteo eram boas: os cristãos de Tessalônica enfrentavam as adversidades e mantinham-se fiéis à fé recebida. Confortado pelas informações trazidas por Timóteo, Paulo decidiu escrever aos cristãos de Tessalônica, felicitando-os pela sua fidelidade ao Evangelho. Aproveitou também para esclarecer algumas dúvidas doutrinais que inquietavam os tessalonicenses – nomeadamente sobre a segunda vinda do Senhor – e para corrigir alguns aspectos menos exemplares da vida da comunidade. A Primeira Carta aos Tessalonicenses é, com toda a probabilidade, o primeiro escrito do Novo Testamento. Apareceu na Primavera-Verão do ano 50 ou 51. Uns meses depois dessa primeira Carta à comunidade cristã de Tessalônica, Paulo escreveu uma outra. O objetivo seria corrigir algumas interpretações erradas que a primeira Carta tinha suscitado.

O texto da Carta aos Tessalonicenses que a liturgia deste domingo nos oferece como segunda leitura refere-se à forma como alguns cristãos de Tessalônica viviam, apenas ocupados em atividades inúteis. Não fica claro, pelo texto, se se trata de simples parasitismo e instalação numa vida fácil, ou se se trata de uma exaltação espiritualista resultante da convicção de que a segunda vinda de Jesus estava próxima e não valeria a pena preocupar-se com a luta diária pela existência. Mas Paulo, com uma dureza inesperada, chama à razão os cristãos de Tessalônica.

Evangelho: segundo Lucas  (Lc 21: 5-19)

O Evangelho do trigésimo terceiro domingo comum nos situa em Jerusalém, num dos dias que precedem a prisão, condenação e morte de Jesus na cruz. O programa de Jesus, nestes dias, é sempre igual: de manhã, se dirige ao templo e passa aí o dia, “a ensinar”; ao final da tarde sai da cidade, atravessa o vale do Cedron e vai até ao Monte das Oliveiras, onde passa a noite.  Esses dias também vão ser marcados por diversas controvérsias entre Jesus e os líderes judaicos. A sombra da cruz paira, a cada instante, no horizonte próximo de Jesus.

Tudo começa com os comentários “de alguns” sobre a beleza e a riqueza do templo de Jerusalém. O templo era, na verdade, uma construção magnífica. Herodes, o Grande, tinha começado as obras de ampliação e de restauração do templo no ano 19 a.C.; mas, na época em que Jesus andava por Jerusalém, os trabalhos continuavam (só foram concluídos por volta do ano 63 d.C.).  A área do templo ocupava uma superfície de mil e quinhentos metros quadrados e as pedras utilizadas na construção chegavam a ter vinte metros de comprimento. Coberto de mármore branco, o templo refletia os raios do sol e brilhava como uma joia preciosa. As portas tinham incrustações de ouro e no interior havia tapeçarias de linho finíssimo de cor azul, escarlate e púrpura.

Em resposta aos comentários sobre a grandiosidade e a beleza do templo, Jesus avisa que, um dia, toda essa construção desaparecerá. Muito impressionados, os interlocutores de Jesus pedem-lhe explicações: quando será isso? Em resposta, Jesus deixa-lhes uma longa instrução que é conhecida como o “discurso escatológico”.

Na versão do evangelista Lucas, o “discurso escatológico” de Jesus menciona três momentos, ou temas, da história futura: a destruição de Jerusalém (que veio a concretizar-se no ano 70, quando as tropas romanas sob o comando de Tito tomaram Jerusalém e destruíram o templo), as vicissitudes que os discípulos irão enfrentar ao longo do seu caminho histórico e, por fim, a vinda definitiva do Filho do Homem. De acordo com o texto de Lucas, Jesus recorre, para falar de tudo isto, a imagens estereotipadas de que os pregadores escatológicos da época se serviam quando discorriam sobre o fim dos tempos. A finalidade de Lucas, ao nos oferecer o “discurso escatológico de Jesus”, não é tanto descrever os acontecimentos da história futura dos homens, mas sim transmitir aos crentes – aos crentes da década de oitenta do primeiro século e aos crentes de todas as épocas – a força para viverem o seu compromisso com Jesus no meio das dificuldades, incompreensões e perseguições que a história os obrigará a enfrentar.