Compreender os textos Bíblicos não é tarefa fácil, e se torna praticamente impossível se não levarmos em conta os aspectos histórico-culturais e os costumes da época em que cada leitura se passa. Há muitas mensagens escritas que se apóiam nestes aspectos, além de leis específicas, metáforas temporais, problemas de tradução e até mesmo estilos usados pelos autores de cada livro, e quais elementos (ou mesmo objetivos) queriam enfatizar em seus textos.

CONDIÇÕES HISTÓRICO-CULTURAIS E COSTUMES DA ÉPOCA DAS PASSAGENS BÍBLICAS

LEITURAS DA SEMANA

"PRÓXIMA REUNIÃO: 31/Julho 8:00pm"

Antes de cada reunião semanal, colocaremos nesta página informações úteis, sobre cada leitura, para nos ajudar nesta "viagem no tempo" e, assim, com o auxílio do Espírito Santo de Deus, entendermos as mensagens com este pano de fundo histórico e, finalmente, podermos transportá-las aos nossos dias e às nossas circunstâncias de hoje.

Ref. Domingo 3/Agosto/2025

18º Domingo do Tempo Comum - Ano C

1ª Leitura:  Livro do Eclesiastes (Ecl 1: 2 , 2: 21-23)

O Livro de Cohelet (designado também como “livro do “Eclesiastes”) é um escrito estranho, enigmático, polêmico, pouco ortodoxo, que se apresenta como uma reflexão sobre o sentido da existência. Pertence à chamada “literatura sapiencial”. O seu autor autointitula-se “Cohelet”. O nome “Cohelet” (assim como o nome grego “Ekklesiastés”) significa “aquele que participa na assembleia” ou, numa perspetiva mais ativa, “aquele que fala na assembleia”. O autor diz ainda, sobre si próprio, que é “filho de David, rei de Jerusalém”. Ora, o único filho de David que reinou em Jerusalém foi Salomão, o “rei sábio”; no entanto, a linguagem próxima do hebreu rabínico (que apresenta traços tardios) e as ideias apresentadas mostram claramente que a redação do livro é bem posterior à época do rei Salomão. Pensa-se que o autor do livro terá sido um judeu conhecedor da cultura e dos valores religiosos do seu povo, talvez dos círculos intelectuais de Jerusalém. A maior parte dos especialistas situam a sua composição pelos finais do séc. III a.C., na primeira fase do processo de helenização da Palestina.

Apesar de se apresentar como uma reflexão de um sábio sobre o sentido da existência, este livro polêmico não fornece respostas para as grandes questões da vida. Pelo contrário, o seu grande objetivo parece ser a destruição das certezas e seguranças que servem de âncora à sabedoria e a catequese tradicionais de Israel. Sempre em tom amargo e pessimista, o autor do livro constata que o homem é incapaz de ter acesso à “sabedoria”, que não há qualquer novidade e que estamos fatalmente condenados a repetir os mesmos desafios, que o esforço humano é vão e inútil, que é impossível conhecer Deus, que nada vale a pena porque a morte está sempre no horizonte e nos iguala com os ignorantes e os animais. Não é um livro onde se vão procurar respostas; é um livro onde se denuncia o fracasso da sabedoria tradicional e onde ecoa o grito de angústia de uma humanidade ferida e perdida, que não compreende a razão de viver.

O texto que a liturgia deste domingo nos propõe como primeira leitura pertence à primeira parte do livro. Aí, pondo-se na pele do rei Salomão, desiludido e amargurado depois de uma vida de glórias e prazeres, o autor constata a inutilidade de todos os esforços do homem e conclui que tudo na vida é “vaidade” ou “ilusão”.

2ª Leitura:  Carta de São Paulo aos Colossenses (Cl 3: 1 - 5: 9-11)

Não foi Paulo que evangelizou a cidade de Colossos, situada na Ásia Menor, ao sul da antiga Frígia, no vale do rio Lico. De acordo com os dados que constam da Carta aos Colossenses, foi Epafras, discípulo de Paulo, quem anunciou o Evangelho de Jesus na cidade. Do esforço missionário de Epafras nasceu uma comunidade viva e empenhada, constituída maioritariamente por cristãos vindos do paganismo, embora também contasse com alguns cristãos de origem judaica.

Na altura em que escreve a Carta aos Colossenses, Paulo está na prisão. Recebendo a visita de Epafras, Paulo soube que tinham chegado a Colossos pregadores cristãos que ensinavam doutrinas erróneas. Esses pregadores, de tendência judaizante mas influenciados por ideias gnósticas, procuravam convencer os colossenses a acolher um conjunto de práticas, tradições e doutrinas que os levariam a uma maior perfeição, a um grau superior da experiência cristã. Exigiam a circuncisão, o respeito pelo sábado, a observância de certas festas judaicas, a abstinência de alguns alimentos; difundiam o culto dos anjos e de certos “poderes” cósmicos que governavam os astros; pregavam a necessidade da submissão a rituais de iniciação em voga no mundo helénico e a práticas rígidas de ascetismo.

Paulo reconheceu, na informação que Epafras lhe trouxe, que havia motivos de preocupação. O Evangelho estava a ser desvirtuado em Colossos, pois as doutrinas que esses pregadores difundiam acabavam por deixar na sombra Cristo e a proposta de salvação que Ele veio trazer. Paulo decidiu então escrever aos Colossenses, acentuando o papel e o lugar de Cristo no projeto salvador de Deus. A Carta poderia ser dos anos 61-63, altura em que Paulo esteve preso em Roma.

O texto que a liturgia deste domingo nos propõe como segunda leitura integra a parte moral da carta. Aí Paulo tira conclusões práticas daquilo que afirmou na primeira parte (que Cristo basta para a salvação) e convoca os Colossenses a viverem, no dia a dia, de acordo com essa vida nova que os identificou com Cristo.

Evangelho: segundo Lucas (Lc 12: 13-21)

Enquanto percorre o caminho que leva da Galileia a Jerusalém, Jesus aproveita todos os pretextos para ir formando os seus discípulos nos valores do Reino de Deus. Dessa forma, os prepara para serem, mais tarde, no “tempo da Igreja”, as testemunhas do Reino diante de todos os povos e nações. Com as lições que, a cada passo, vão recebendo de Jesus, os discípulos crescem na lógica do Evangelho; vão-se despindo das suas lógicas pessoais, egoístas e interesseiras, e interiorizando a proposta de Jesus.

A “lição” de Jesus que o Evangelho deste domingo evoca é exclusiva de Lucas. É iniciada por uma questão relacionada com partilhas… Um homem não identificado pede a Jesus que intervenha como árbitro numa questão de repartição da herança familiar. Segundo as tradições judaicas, o filho primogênito de uma família de dois irmãos recebia dois terços das possessões paternas. O homem que interpela Jesus será o irmão mais novo, que ainda não tinha recebido a sua parte da herança? Será um irmão descontente com a avaliação dos bens feita pelo outro irmão? Estará a pedir a intercessão de Jesus para que o seu irmão seja mais generoso na repartição dos bens familiares? O texto de Lucas não nos esclarece sobre estes pormenores.

Era frequente, no tempo de Jesus, que os escribas e doutores da lei, versados nas escrituras, assumissem o papel de juízes em casos similares. Competia-lhes, a partir da Lei, indicar como resolver situações discutíveis. O homem que solicita a intervenção de Jesus chama-lhe “mestre” (“didaskale”), reconhecendo-lhe uma autoridade semelhante à dos escribas e doutores da Lei.