Compreender os textos Bíblicos não é tarefa fácil, e se torna praticamente impossível se não levarmos em conta os aspectos histórico-culturais e os costumes da época em que cada leitura se passa. Há muitas mensagens escritas que se apóiam nestes aspectos, além de leis específicas, metáforas temporais, problemas de tradução e até mesmo estilos usados pelos autores de cada livro, e quais elementos (ou mesmo objetivos) queriam enfatizar em seus textos.

CONDIÇÕES HISTÓRICO-CULTURAIS E COSTUMES DA ÉPOCA DAS PASSAGENS BÍBLICAS

LEITURAS DA SEMANA

"PRÓXIMA REUNIÃO: 9/Outubro 8:00pm"

Antes de cada reunião semanal, colocaremos nesta página informações úteis, sobre cada leitura, para nos ajudar nesta "viagem no tempo" e, assim, com o auxílio do Espírito Santo de Deus, entendermos as mensagens com este pano de fundo histórico e, finalmente, podermos transportá-las aos nossos dias e às nossas circunstâncias de hoje.

Ref. Domingo 12/Outubro/2025

28º Domingo do Tempo Comum - Ano C

1ª Leitura:  Segundo Livro dos Reis (2Rs 5: 14-17)

A primeira leitura deste domingo nos situa no reino do Norte (Israel), durante o reinado de Jorão (852-841 a.C.). Por essa altura os reis de Israel, determinados em reivindicar para o seu país um lugar de destaque no tabuleiro político do antigo Médio Oriente, promovem contatos comerciais, culturais e políticos com outros reinos da região. Essa política, se por um lado favorece a interculturalidade e o diálogo de povos, por outro lado vai ameaçar a identidade e os valores tradicionais de Israel. Em termos religiosos, essa política de abertura de fronteiras traduzir-se-á numa invasão de deuses, de cultos e de valores estranhos, que ameaçam a integridade da fé javista. O rei Jorão ainda se preocupou em eliminar dos santuários do Norte “as estátuas que seu pai tinha erigido a Baal”; contudo, não conseguiu impedir que os deuses cananeus assumissem um grande protagonismo e que Baal tivesse ocupado o lugar de Javé no coração e na vida de muitos israelitas.

Nesta fase, o profeta Eliseu (o nome significa “Deus salva”) se coloca como o grande defensor da fé javista continuando, aliás, a obra do seu antecessor, o profeta Elias. Tanto quanto sabemos, Eliseu fazia parte de uma comunidade de “filhos dos profetas”. Trata-se, provavelmente, de um círculo religioso e profético cujos membros eram, nesses tempos difíceis, os seguidores incondicionais de Javé. Críticos da realeza, os “filhos dos profetas” defendiam o povo simples, a todo o instante vítima da injustiça e da arbitrariedade dos poderosos.

É neste cenário que, inesperadamente, os autores deuteronomistas decidem colocar a história de um venerável general estrangeiro chamado Naamã. Considerado um dos heróis da Síria, Naamã era leproso (na realidade, a doença de Naamã devia ser uma outra qualquer doença de pele, sem as características da tradicional lepra, uma vez que não o impedia de viver em contato com outras pessoas). Informado por uma serva de que em Israel havia um profeta que podia curá-lo, Naamã veio ao encontro de Eliseu, carregado de presentes, para ver se o profeta conseguia limpá-lo da lepra. Eliseu mandou, apenas, que Naamã se banhasse sete vezes no rio Jordão.

2ª Leitura:  Segunda Carta de São Paulo a Timóteo (2Tm 2: 8-13)

A Segunda Carta a Timóteo faz parte de um bloco de textos neotestamentários a que se costuma chamar “Cartas Pastorais”. São textos dirigidos a “pastores” de comunidades (Tito e Timóteo), com conselhos e indicações para um frutuoso exercício do ministério que lhes foi confiado.

Timóteo, o destinatário desta carta, era natural de Listra, uma cidade situada na região da Licaônia, na Ásia Menor (atual Turquia). Era filho de pai grego e de mãe judeo-cristã. Timóteo conheceu o apóstolo Paulo quando este, no decurso da sua segunda viagem missionária, passou por Listra. Tornou-se companheiro de missão de Paulo, acompanhando-o à Bereia, Atenas, Corinto e Éfeso. Paulo confiava plenamente em Timóteo, chegando a encarregá-lo de algumas missões delicadas junto de comunidades cristãs que se defrontavam com problemas. A tradição cristã refere Timóteo como o primeiro bispo de Éfeso.

Como a primeira Carta a Timóteo, também esta se apresenta como uma carta escrita por Paulo da prisão (em Roma?) ao seu discípulo Timóteo. Tem quase a forma de um testamento de despedida, numa altura em que Paulo sentiria aproximar-se o tempo da sua partida deste mundo. Embora esta carta seja, entre as Cartas Pastorais, a que mais se aproxima do estilo de Paulo, não é considerada, pela maioria dos especialistas, como uma carta paulina. Reflete a realidade e a organização de uma Igreja do final do séc. I, numa altura em que Paulo já tinha desaparecido (Paulo foi martirizado em Roma, por volta do ano 65, durante a perseguição de Nero).

No texto que a liturgia deste dia nos apresenta como segunda leitura, o autor da carta diz a Timóteo porque é que ele deve dedicar-se totalmente ao ministério que lhe foi confiado.

Evangelho: segundo Lucas (Lc 17: 11-19)

Jesus e os discípulos vão a caminho de Jerusalém. Lucas indica que o episódio que vai ser narrado sucedeu quando passavam “entre a Samaría e a Galiléia”. A indicação é imprecisa; mas a preocupação fundamental de Lucas não é apresentar um itinerário geográfico detalhado, mas sim dar-nos conta de uma “peregrinação espiritual” durante a qual os discípulos vão amadurecendo a proposta de Jesus e aprofundando o seu compromisso com o Reino de Deus. O grupo que caminha com Jesus depara-se, “ao entrar numa povoação”, com um grupo de dez leprosos.

O leproso era, no tempo de Jesus, o protótipo do marginalizado. O aspecto físico de um leproso causava repugnância; o medo da contaminação fazia com que todos se afastassem do doente. Além disso, a teologia oficial considerava o leproso um impuro ritual, um “castigado por Deus” por ter cometido pecados especialmente graves. O contato com um leproso provocava impureza; por isso, o leproso não podia entrar nas povoações: vivia em lugares isolados e, quando alguém se aproximava, devia avisar da sua triste condição, gritando: “impuro, impuro”. Estava-lhe inclusive vedada a entrada na cidade de Jerusalém, a fim de não violar, com a sua impureza, o lugar sagrado onde estava o templo. No caso improvável de cura, o leproso devia apresentar-se diante de um sacerdote, a fim de que este comprovasse o fato e lhe permitisse a reintegração na vida normal. Podia, então, voltar a participar nas celebrações do culto.

Há um outro elemento a considerar no relato de Lucas: um dos leprosos que se apresentam diante de Jesus é samaritano. Os habitantes da Samaria eram desprezados pelos judeus de Jerusalém, por causa do seu sincretismo religioso. A desconfiança religiosa dos judeus em relação aos samaritanos começou quando, em 721 a.C. (após a queda do reino do Norte), os colonos assírios invadiram a Samaria e começaram a misturar-se com a população local. Para os judeus, os habitantes da Samaria começaram, então, a paganizar-se. Alguns anos depois, após o regresso do exílio da Babilônia, os habitantes de Jerusalém recusaram a ajuda dos samaritanos na reconstrução do Templo e evitaram os contatos com esses hereges, “raça misturada com pagãos”. A construção de um santuário samaritano no monte Garizim (séc. IV a.C.) consumou a separação entre as duas comunidades e, na perspetiva judaica, lançou definitivamente os samaritanos nos caminhos da infidelidade a Javé. Algumas picardias mútuas nos séculos seguintes consolidaram a inimizade entre judeus e samaritanos. Na época de Jesus, a relação entre as duas comunidades era marcada por uma grande hostilidade.

O episódio da cura dos dez leprosos por Jesus, é exclusivo de Lucas.