Compreender os textos Bíblicos não é tarefa fácil, e se torna praticamente impossível se não levarmos em conta os aspectos histórico-culturais e os costumes da época em que cada leitura se passa. Há muitas mensagens escritas que se apóiam nestes aspectos, além de leis específicas, metáforas temporais, problemas de tradução e até mesmo estilos usados pelos autores de cada livro, e quais elementos (ou mesmo objetivos) queriam enfatizar em seus textos.

CONDIÇÕES HISTÓRICO-CULTURAIS E COSTUMES DA ÉPOCA DAS PASSAGENS BÍBLICAS

LEITURAS DA SEMANA

"PRÓXIMA REUNIÃO: 5/Novembro 8:00pm"

Antes de cada reunião semanal, colocaremos nesta página informações úteis, sobre cada leitura, para nos ajudar nesta "viagem no tempo" e, assim, com o auxílio do Espírito Santo de Deus, entendermos as mensagens com este pano de fundo histórico e, finalmente, podermos transportá-las aos nossos dias e às nossas circunstâncias de hoje.

Ref. Domingo 9/Novembro/2025

32º Domingo do Tempo Comum - Ano C

Festa - Dedicação da Basílica de Latrão

História da Basílica de Latrão (Catedral de Roma)

A Arquibasílica do Santíssimo Salvador e dos Santos João Batista e Evangelista, comumente conhecida como San Giovanni in Laterano, fica perto do Monte Celio.

Originalmente, antes da construção da basílica, esta área era propriedade da antiga família Latrão, que tinha sua casa nas proximidades.  Os Anais de Tácito em 65 d.C. falam de um confisco por parte de Nero, devido ao envolvimento de alguns familiares numa conspiração contra o próprio imperador.

Só mais tarde as terras passaram a ser propriedade de uma certa Fausta, reconhecida como esposa de Flávio Valerio Costantino, proclamado imperador por morte do pai em 306.

O imperador Constantino, com o edito de Milão de 313, dará liberdade de culto aos cristãos e, tendo o cuidado de oferecer à nascente Igreja um local adequado para realizar as celebrações, entrega ao Papa Melquíade as terras de Latrão que sua esposa lhe trouxe como dote para construir uma igreja para os cristãos.

A Basílica, consagrada em 324 pelo Papa Silvestre I, foi dedicada ao Santíssimo Salvador.  Finalmente, no século IX, Sérgio III também a dedicou a São João Batista e no século XII.  Lúcio II acrescentou São João Evangelista.

Do quarto ao décimo quarto século, quando o Papa se mudou para Avignon, o Latrão foi a principal sede do papado, tornando-se o símbolo e o coração da vida da Igreja.

Em 1378, com a eleição de Gregório XI, a sede do pontífice voltou para Roma, mas como Latrão estava em péssimas condições, decidiu-se transferir o poder para o Vaticano.

Somente em 1650, por ordem do Papa Inocêncio X, foi decidida a reorganização e recuperação total da Basílica graças ao trabalho de Francesco Borromini.

É importante entender que, apesar da Basílica de São Pedro ser o centro da Igreja Católica Apostólica Romana dentro do Estado do Vaticano, o Sumo Pontífice acumula outra posições (ou títulos), além de ser um chefe de Estado. O Papa é também o Bispo de Roma - e, como em todo o mundo, um Bispo (ou Arcebispos), é responsável por uma Diocese (ou uma Arquidiocese) e, para eles, a uma igreja, ou a uma basílica, ou ainda mesmo a um santuário, é atribuído o título de Catedral, transformando-se em local oficial da Cátedra (cadeira), sede religiosa oficial para celebrações comandadas por este Bispo.

A Basílica de S. João de Latrão é a catedral do Papa, enquanto Bispo de Roma.  Ela é chamada “a igreja-mãe de todas as igrejas da Urbe e do Orbe”; e é o símbolo das Igrejas de todo o mundo, unidas à volta do sucessor de Pedro. A Festa da Dedicação da Basílica de Latrão nos convida a tomar consciência de que a Igreja nascida de Jesus (que a Basílica de S. João de Latrão simboliza e representa) é hoje, no meio do mundo, a “morada de Deus”, o testemunho vivo da presença de Deus na caminhada histórica dos homens.

1ª Leitura:  Profecia de Ezequiel (Ez 47: 1-2, 8-9, 12)

Ezequiel integrava o grupo de jerusalimitanos que o rei babilônio Nabucodonosor, depois de derrotar Joaquin, rei de Judá, e de conquistar pela primeira vez Jerusalém, em 597 a.C., deportou para a Babilônia. Foi aí, entre os seus concidadãos exilados, que Ezequiel exerceu a sua missão profética.

A primeira fase do ministério de Ezequiel decorre entre 593 a.C. (altura em que sentiu o chamamento de Deus) e 586 a.C. (data em que Jerusalém é novamente conquistada pelas tropas de Nabucodonosor e uma nova leva de exilados é encaminhada para a Babilônia). Nesta fase, muitos dos exilados acreditavam que o cativeiro terminaria dentro de pouco tempo e que iriam ser autorizados a retornar a Jerusalém. Ezequiel, por mandato de Deus, procura destruir essas falsas esperanças: o cativeiro vai durar por um tempo longo ainda. Aliás, o que vai acontecer é precisamente o contrário: Jerusalém vai ser novamente tomada pelos babilônios e muitos dos que escaparam da primeira deportação serão levados para a Babilônia e irão fazer companhia aos que já lá estão. De fato, assim aconteceu.

A segunda fase do ministério de Ezequiel se desenrola a partir de 586 a.C., até cerca de 570 a.C. Instalados numa terra estrangeira, sem Templo, sem sacerdócio, sem culto, os exilados estão desesperados. Duvidam da fidelidade de Deus, da Sua bondade e do Seu amor. Nessa fase, Ezequiel assume um discurso diferente. Com a sua palavra e os seus gestos proféticos procura alimentar a esperança dos exilados e lhes transmitir a certeza de que Deus não os abandonou. O texto que hoje nos é proposto pertence a esta segunda fase.

Para dar corpo à esperança, Ezequiel anuncia aos exilados a chegada de uma nova era, de felicidade e de paz sem fim… Será o tempo em que Deus irá, Ele próprio, assumir a condução do seu Povo, como um “Bom Pastor” que cuida das suas ovelhas; será o tempo em que Deus vai tornar de novo fecundos os campos sobre os quais se abateu a guerra e a desolação e reconstruir e repovoar as cidades abandonadas e calcinadas; será o tempo em que Deus vai operar uma mudança no interior dos homens, substituindo os “corações de pedra”, duros e insensíveis, por “corações de carne”, capazes de acolher os preceitos da Aliança e de viver no amor a Deus e aos irmãos; será o tempo em que o Templo de Jerusalém será reconstruído e Deus irá voltar a residir no meio do seu Povo.

Com a promessa de que Deus vai voltar a residir no meio do seu Povo, chegamos ao ponto culminante dessa “teologia da esperança” que Ezequiel, por indicação de Deus, propõe aos seus concidadãos. Mais do que o próprio exílio numa terra estrangeira, Israel lamentava o desaparecimento do Templo (a “residência de Deus”) e da “Glória de Javé” (a “Glória” equivalia à presença gloriosa de Deus no meio do seu Povo, oferecendo a Judá a salvação e a vida). Mas Ezequiel garante aos exilados que Deus vai construir um Novo Templo, do qual sairá vida em abundância e no qual a “Glória de Javé” voltará a habitar.

2ª Leitura:  Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios (1Cor 3: 9c-11, 16-17)

No séc. I Corinto era uma cidade próspera e um centro cultural importante. Servida por dois portos de mar, nela se cruzavam diariamente pessoas de todas as raças e de todas as religiões. Era a cidade do desregramento para todos os marinheiros que cruzavam o Mediterrâneo, ávidos de prazer, após meses de navegação. Na cidade pontificava a deusa Afrodite, em cujo templo se praticava a prostituição sagrada. Na época de Paulo, Corinto comportava cerca de 500.000 pessoas, das quais dois terços eram escravos. A riqueza escandalosa de alguns contrastava com a miséria da maioria.

No decurso da sua segunda viagem missionária, Paulo chegou a Corinto, depois de atravessar boa parte da Grécia, e ficou por lá cerca 18 meses (anos 50-52). De acordo com At 18: 2-4, Paulo começou a trabalhar em casa de Priscila e Áquila, um casal de judeo-cristãos recentemente chegados de Itália. No sábado, usava da palavra na sinagoga. Com a chegada a Corinto de Silvano e Timóteo, Paulo consagrou-se inteiramente ao anúncio do Evangelho. No entanto, não tardou a entrar em conflito com os judeus e foi expulso da sinagoga.

Como resultado da pregação de Paulo, nasceu a comunidade cristã de Corinto. A maior parte dos membros da comunidade eram de origem grega, embora, em geral, de condição humilde; mas havia também elementos de origem hebraica.

De uma forma geral, a comunidade era viva e fervorosa; no entanto, estava exposta aos perigos de um ambiente corrupto: moral dissoluta, querelas, disputas, lutas, sedução da sabedoria filosófica de origem pagã que se introduzia na Igreja revestida de um superficial verniz cristão. Tratava-se de uma comunidade forte e vigorosa, mas que mergulhava as suas raízes em terreno adverso. Em Corinto estão bem representadas as dificuldades da fé cristã em inserir-se num ambiente hostil, marcado por uma cultura pagã e por um conjunto de valores em profunda contradição com a pureza da mensagem evangélica.

O texto que hoje nos é proposto como segunda leitura está inserido num contexto de polêmica. Depois de Paulo ter deixado a cidade, apareceu por lá um cristão de origem judaica com o nome de Apolo. Era um brilhante pregador e foi de grande utilidade para a comunidade nas polémicas doutrinais com os judeus de Corinto. Formaram-se partidos (embora Apolo não favorecesse essa divisão, segundo parece): uns admiravam Paulo, outros Pedro, outros Apolo. Aredita-se que os vários partidos manifestassem uma certa rivalidade, à imagem das escolas filosóficas gregas que estavam espalhadas por toda a cidade de Corinto. De qualquer forma, a comunidade estava dividida e, dia a dia, acentuavam-se os conflitos, os ciúmes, as lutas, as rivalidades.

Este estado alarmante da comunidade chegou ao conhecimento de Paulo quando o apóstolo se encontrava em Éfeso, no decurso da sua terceira viagem apostólica. Imediatamente, Paulo escreveu aos Coríntios questionando a opção dos membros da comunidade pela sabedoria do mundo, em detrimento da sabedoria de Deus. Depois de apresentar a “sabedoria de Deus”, revelada em Jesus Cristo (sobretudo através da “loucura da cruz”) e oferecida aos homens, Paulo constata que os coríntios ainda não acolheram essa sabedoria: mantêm-se na dimensão do homem carnal (isto é, do homem fraco, pecador, escravo das suas paixões e apetites), imaturos na fé; cultivam as divisões e os conflitos; correm atrás de mestres humanos como se eles tivessem a chave da felicidade e da realização plena, esquecendo que, por detrás de Paulo ou de Apolo, está Deus.

As fraturas comunitárias serão o testemunho que Deus espera dos cristãos de Corinto?

Evangelho: segundo João (Jo 2: 13-22)

O autor do Quarto Evangelho apresenta, na seção introdutória do seu livro, um gesto profético de Jesus, realizado logo no início do Seu ministério: a expulsão dos vendilhões do templo de Jerusalém. Ao situar o episódio nesse enquadramento, o evangelista João está provavelmente a sugerir que o gesto de Jesus é um anúncio programático do ministério que, a partir dali, Ele vai desenvolver, por mandato de Deus: apresentar-se Ele próprio como o Novo templo, o “lugar” onde os homens podem encontrar-se com Deus e ter acesso a Deus. Mateus, Marcos e Lucas, por seu turno, têm outro entendimento e situam o mesmo episódio nos últimos dias do ministério de Jesus, poucos dias antes da sua morte.

A cena descrita no Evangelho deste dia situa-nos, portanto, no átrio externo do templo de Jerusalém, nos dias que antecedem a celebração da Páscoa. Era a época em que as grandes multidões se concentravam em Jerusalém para celebrar a festa principal do calendário religioso judaico. Jerusalém, que normalmente teria à volta de 55.000 habitantes, chegava a albergar, por essa altura, cerca de 125.000 peregrinos. No templo sacrificavam-se cerca de 18.000 cordeiros, destinados à celebração pascal. Neste ambiente, o comércio relacionado com o Templo sofria um espantoso incremento. Três semanas antes da Páscoa, começava a emissão de licenças para a instalação dos postos comerciais à volta do Templo. O dinheiro arrecadado com a emissão dessas licenças revertia para o sumo sacerdote. Havia tendas de venda que pertenciam, diretamente, à família do sumo sacerdote. Vendiam-se os animais para os sacrifícios e vários outros produtos destinados à liturgia do Templo. Havia, também, as tendas dos cambistas que trocavam as moedas romanas correntes por moedas judaicas (os tributos dos fiéis para o Templo eram pagos em moeda judaica, pois não era permitido que moedas com a efígie de imperadores pagãos maculassem o tesouro do Templo). Este comércio constituía uma mais valia para a cidade e sustentava a nobreza sacerdotal, o clero e os empregados do templo.

O templo, cenário deste episódio, era, na verdade, uma construção magnífica. Herodes, o Grande, para demonstrar as suas boas disposições para com o culto a Javé e para conseguir a benevolência dos judeus, tinha começado as obras de ampliação e de restauração do templo no ano 19 a.C.; mas, na época em que Jesus andava por Jerusalém, os trabalhos continuavam (só foram concluídos por volta do ano 63 d.C.). A área do templo ocupava uma superfície de mil e quinhentos metros quadrados e as pedras utilizadas na construção chegavam a ter vinte metros de comprimento. Coberto de mármore branco, o templo refletia os raios do sol e brilhava como uma joia preciosa. As portas tinham incrustações de ouro e no interior havia tapeçarias de linho finíssimo de cor azul, escarlate e púrpura. O templo, “casa de Deus”, lugar sagrado por excelência, era o orgulho de Israel.