Compreender os textos Bíblicos não é tarefa fácil, e se torna praticamente impossível se não levarmos em conta os aspectos histórico-culturais e os costumes da época em que cada leitura se passa. Há muitas mensagens escritas que se apóiam nestes aspectos, além de leis específicas, metáforas temporais, problemas de tradução e até mesmo estilos usados pelos autores de cada livro, e quais elementos (ou mesmo objetivos) queriam enfatizar em seus textos.

CONDIÇÕES HISTÓRICO-CULTURAIS E COSTUMES DA ÉPOCA DAS PASSAGENS BÍBLICAS

LEITURAS DA SEMANA

"PRÓXIMA REUNIÃO: 21/Julho 8:00pm"

Antes de cada reunião semanal, colocaremos nesta página informações úteis, sobre cada leitura, para nos ajudar nesta "viagem no tempo" e, assim, com o auxílio do Espírito Santo de Deus, entendermos as mensagens com este pano de fundo histórico e, finalmente, podermos transportá-las aos nossos dias e às nossas circunstâncias de hoje.

Ref. Domingo 24/Agosto/2025

21º Domingo do Tempo Comum - Ano C

1ª Leitura:  Livro do Profeta Isaías (Is 66: 18-21)

Nos capítulos 56 a 66 do livro de Isaías (o “Trito-Isaías”) temos uma coleção de textos, provavelmente de autores diversos, redigidos em Jerusalém na época pós-exílica (talvez nos últimos anos do séc. VI e princípios do séc. V a.C). O texto que a liturgia deste segundo domingo comum nos apresenta como primeira leitura pertence a essa coleção.

Dentro das fronteiras do antigo reino de Judá temos, por esta época, uma comunidade heterodoxa, que agrupa judeus regressados do Exílio na Babilônia, judeus que não foram à Babilónia pois conseguiram ficar em Judá mesmo após a catástrofe de 586 a.C., estrangeiros que se estabeleceram em Jerusalém durante o Exílio e outros que, após o regresso dos exilados, vieram oferecer a sua mão-de-obra para a reconstrução de Jerusalém. A forte presença de estrangeiros dentro das fronteiras de Judá levanta algumas questões. Como é que a comunidade judaica deve encará-los? Deve acolhê-los e integrá-los, ou deve evitar quaisquer contatos com eles? As respostas a estas questões não são fáceis, pois a comunidade regressada do Exílio, ameaçada por inimigos internos (as gentes que ficaram no país e que não entendem o zelo religioso dos retornados) e por inimigos externos (sobretudo os samaritanos), tem tendência a desconfiar e a fechar-se. Esdras e Neemias, os grandes líderes judaicos desta fase, apostados em evitar influências negativas na “santidade” do Povo de Deus, favorecem uma política xenófoba, proibindo até os casamentos mistos.

Entre as diversas questões abordadas pelos textos do Trito-Isaías está também o problema dos estrangeiros. Tratando-se de uma coletânea de textos de autores e pregadores diversos, é natural que nela constem visões contraditórias sobre essa temática: a par de apelos ao aniquilamento das nações que se obstinam no mal, aparecem propostas de admissão e de integração de estrangeiros no seio do Povo de Deus. No geral domina, apesar de tudo, a perspetiva universalista. É, aliás, nessa perspetiva aberta e tolerante para com os outros povos que a primeira leitura deste vigésimo primeiro domingo comum nos coloca.

2ª Leitura:  Carta aos Hebreus (Hb 12: 5-7, 11-13)

A chamada “Carta aos Hebreus” parece mais ser uma homilia destinada à proclamação oral do que propriamente uma carta. O tom é solene, expositivo, doutrinal, carregado de erudição e de referências teológicas.

A tradição oriental atribuiu o texto a São Paulo. No entanto, cedo começaram a surgir argumentos contra a autenticidade paulina da Carta aos Hebreus. As diferenças de linguagem, de estilo e mesmo de ideias em relação a outros textos autenticamente paulinos levaram os biblistas a descartar a possibilidade de São Paulo ter sido o seu autor. Admite-se, no entanto, que esse autor tenha sido alguém relacionado com São Paulo, talvez um discípulo do apóstolo. Muito provavelmente a Carta aos Hebreus terá sido redigida alguns anos antes do ano setenta, quando o Templo de Jerusalém ainda não tinha sido destruído pelas tropas romanas.

Não foi possível apurar quem são os destinatários concretos desta reflexão. Para alguns, o designativo “aos hebreus” poderia indicar que os seus destinatários seriam judeus convertidos ao cristianismo; mas, para outros, essa indicação – que apareceu tardiamente – não é decisiva. É verdade que o autor refere frequentemente fatos, figuras e tipologias do Antigo Testamento; mas isso não nos autoriza a concluir que os destinatários da Carta provenham exclusivamente do mundo judaico, uma vez que, pelo ano setenta, o Antigo Testamento era já referência fundamental para todas as comunidades cristãs, quer as oriundas do mundo judaico, quer as que provinham do mundo greco-romano. Seja como for, o que parece claro é que os destinatários da Carta aos Hebreus são cristãos que vivem numa situação difícil, num ambiente hostil à fé cristã; perderam o entusiasmo inicial e instalaram-se numa fé rotineira, morna e pouco exigente. O autor procura fortalecê-los na vivência do compromisso cristão e ajudá-los a crescer na fé.

A figura de Cristo é central na “Carta aos Hebreus”. Apresentado como sumo sacerdote, Ele é o mediador entre Deus e os homens. A sua entrega sacrificial na cruz substitui todos os sacrifícios do antigo culto judaico, estabelece uma nova Aliança entre Deus e os homens e inaugura um culto novo. Pelo sacerdócio de Cristo, os crentes são inseridos no Povo sacerdotal que é a comunidade cristã.

O texto que a liturgia do décimo primeiro domingo comum nos propõe como segunda leitura integra uma parte da carta onde o autor faz um veemente apelo à constância e à perseverança na fé. Jesus, “autor e consumador da fé”, aquele que “renunciando à alegria que lhe fora proposta, sofreu a cruz, mas que depois se sentou à direita do trono de Deus”, é o modelo que os cristãos devem ter sempre diante dos olhos.

Evangelho: segundo Lucas (Lc 13: 22-30)

“Jesus dirigia-se para Jerusalém e ensinava nas cidades e aldeias por onde passava” (vers. 22). É a segunda menção direta que Lucas faz (a primeira tinha sido em Lc 9,51) a essa “viagem” que leva Jesus da Galileia a Jerusalém para enfrentar as autoridades religiosas judaicas e lhes apresentar o projeto de salvação que Deus lhe confiou. Os discípulos caminham atrás de Jesus. Em cada passo do caminho, Jesus se detém para explicar o “mapa” do Reino de Deus. Embora as lições de Jesus se destinem a toda a gente, elas têm como destinatários privilegiados os discípulos: eles devem assimilar a lógica do Reino, para serem depois, após a morte e a ressurreição de Jesus, as testemunhas do Evangelho em todo o mundo.

O texto que Lucas nos propõe é constituído por materiais de distintas procedências, aqui agrupados por razões de interesse temático. Estes materiais seriam, inicialmente, “ditos” de Jesus – pronunciados em contextos distintos – sobre a entrada no Reino de Deus (o evangelista Mateus apresenta os mesmos “ditos” sob formas e em contextos diferentes – cf. Lc 13,23-24 e Mt 7,13-14; Lc 13,25 e Mt 25,10-12; Lc 13,26-27 e Mt 7,22-23; Lc 13,28-29 e Mt 8,12; Lc 13,30 e Mt 19,30). Lucas os utiliza para mostrar as diferenças entre a teologia dos judeus e a de Jesus, a propósito da salvação.